BRASIL E ARGENTINA EM 2024: DINÂMICAS POLÍTICAS E ECONÔMICAS

BRASIL E ARGENTINA EM 2024: DINÂMICAS POLÍTICAS E ECONÔMICAS

Fonte: imagem de Francisco Cassano (Cobizz, 2021)

Introdução

A relação entre Brasil e Argentina, duas das maiores economias da América do Sul, está passando por uma fase de transformação e adaptação diante do novo presidente argentino, Javier Milei, eleito em 2023. A recente mudança de governo na Argentina, introduziu uma nova dinâmica nas relações entre os dois países vizinhos. Sob a liderança de Milei, o país está testemunhando mudanças políticas e econômicas significativas, com uma abordagem voltada para reformas e uma visão que difere das políticas anteriores. Essa mudança de paradigma tem despertado interesse e gerado especulações sobre os rumos das relações entre Brasil e Argentina, ambos os quais historicamente têm tido laços complexos e interdependentes. Nesta redação, serão analisadas as relações políticas e econômicas entre o Brasil e Argentina entre  o final de 2023 e início de 2024.

Histórico das Relações Bilaterais

A relação histórica entre Brasil e Argentina é destacada por instabilidade, estabilidades, busca pela cooperação e busca pela integração durante os anos. É possível observar essa relação através da tabela seguinte:

Fonte: imagem de Warley Candeas por Revista Brasileira de Política Externa

É perceptível que com o fortalecimento da democracia, as relações são estreitadas gerando uma grande busca pela integração. Durante o século XIX a relação bilateral Brasil- Argentina foi marcada por instabilidade, a busca pela integração teve um florescimento durante o século XXI. Ademais, entre 1979-1987 o incentivo a estabilidade estrutural pela cooperação é visível e a partir de 1988 até os dias atuais há uma grande busca pela integração. Essa busca é refletida na assinatura da Ata para a Integração Brasileiro-Argentina, em 1986 entre o presidente Alfonsín e Sarney. Desde então, o processo de integração é incorporado de maneira aprofundada na Política Externa de cada Estado. Entretanto, com o advento das eleições para 2024, com o novo presidente  Javier Milei, muitas questões surgiram para entender o que poderia mudar nas relações atuais entre Brasil e Argentina política e economicamente. (CANDEAS, 2005)

Análise política

Com a eleição de Javier Milei como presidente em novembro de 2023, marcou-se um ponto de inflexão nas relações diplomáticas entre Buenos Aires e Brasília. Em contraste com as expectativas convencionais, Milei escolheu fazer sua primeira viagem internacional a Washington, não a Brasília, desencadeando especulações sobre os rumos da diplomacia argentina sob sua liderança. Enquanto isso, no Brasil, o presidente Lula, do Partido dos Trabalhadores (PT), optou por uma postura diplomática cordial, felicitando o novo governo argentino e expressando desejos de colaboração, apesar de não mencionar diretamente Milei em suas declarações.

Desejo boa sorte e êxito ao novo governo. A Argentina é um grande país e merece todo o nosso respeito. O Brasil sempre estará à disposição para trabalhar junto com nossos irmãos argentinos”

(Luís Inácio Lula da Silva, 2023, CNN Brasil)

No entanto, as relações entre os dois líderes não estavam isentas de tensões. Em meio a previsões de instabilidade política na América Latina, Lula fez menção à necessidade de diálogo entre os líderes regionais para resolver potenciais conflitos. Essa postura, embora não explicitamente direcionada a Milei, refletiu as preocupações do presidente brasileiro sobre a estabilidade política na região. Em contrapartida, Milei não hesitou em dirigir críticas a Lula, rotulando-o publicamente como “comunista” e “corrupto”, durante a sua campanha, sinalizando possíveis atritos entre os dois líderes. (GUERRA, 2023)

Depois de eleito, em um gesto aparentemente conciliatório, a ministra das Relações Exteriores de Milei, Diana Mondino, realizou uma visita discreta a Brasília, onde se encontrou com o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, no Palácio do Itamaraty. Durante a reunião, Mondino entregou uma carta pessoal do presidente Milei ao presidente Lula, em um esforço para iniciar um diálogo construtivo entre os dois países. Na carta também havia um convite para a posse do presidente. Entretanto, o presidente Lula enviou Mauro Vieira como seu representante para estar presente na posse do presidente argentino. (MAZUI, 2023)

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, e a chanceler argentina, Diana Mondino — Fonte: Palácio do Itamaraty/Divulgação

Um ponto crucial da reunião foi a indicação de um desejo mútuo de estabelecer uma base sólida para as relações diplomáticas futuras, apesar das divergências políticas iniciais entre os líderes.

“Sabemos que nossos países estão estreitamente ligados pela geografia e pela história e, a partir disso, desejamos seguir compartilhando áreas complementares, a nível de integração física, comércio e presença internacional, que permitam que todo esta atuação conjunta se traduza, de ambos os lados, em crescimento e prosperidade para argentinos e brasileiros”

(Javier Gerardo Milei, 2023, G1)

A reunião entre a ministra das Relações Exteriores argentina, Diana Mondino, e o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, no Palácio do Itamaraty, trouxe à tona um ponto de interesse crucial para ambas as nações: o acordo entre o Mercosul e a União Europeia. O Itamaraty, órgão responsável pela condução da política externa brasileira, destacou que um dos aspectos mais significativos desse encontro foi a manifestação de apoio do futuro governo argentino à conclusão desse acordo, que tem sido uma prioridade para o Brasil.

O acordo de livre comércio, caso assinado, permitiria a remoção de tarifas da União Europeia em 100% para os bens industriais provenientes do Mercosul. A sinalização positiva por parte do governo argentino em relação ao acordo é vista como um passo importante na direção da integração econômica regional e da abertura de novos mercados para os produtos sul-americanos. O Brasil tem desempenhado um papel ativo nas negociações para finalizar este acordo. Entretanto, atualmente as negociações encontram-se suspensas até que finalizem as eleições parlamentares europeias de 2024. (Baltensperger; Dadush, 2019, p. 3-4).

A remoção das tarifas representa uma oportunidade significativa para os países do Mercosul, especialmente para o Brasil e a Argentina, cujas economias se beneficiariam enormemente do acesso ampliado ao mercado europeu. Isso poderia resultar em um aumento nas exportações e, consequentemente, um impulso para os setores industriais desses países. No entanto, a suspensão das negociações até a conclusão das eleições europeias destaca a incerteza política que ainda envolve o acordo. A evolução do cenário político na Europa pode influenciar diretamente a continuidade e os termos finais das negociações.

Análise econômica

Em relação a economia Argentina, a inflação apresentou uma queda notável em março, atingindo 11%, em comparação com os 13,2% registrados em fevereiro, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (INDEC). Essa redução é atribuída à correção inicial dos preços relativos realizada em dezembro de 2023, apesar dos efeitos estatísticos tardios que ainda persistem. Além disso, desde a posse do presidente Milei, o banco central argentino adotou medidas para reduzir substancialmente a base monetária, visando absorver a liquidez e conter os aumentos de preços, evidenciando os esforços para estabilizar a economia do país. (Inflação da Argentina recua, 2024)

Apesar da queda significativa de 28% nas exportações brasileiras para a Argentina no primeiro trimestre de 2024, o país vizinho continua sendo o quarto maior destino das exportações do Brasil. Essa diminuição está relacionada ao rigoroso ajuste econômico implementado pelo governo argentino para revitalizar sua economia, diante das previsões pessimistas do Fundo Monetário Internacional (FMI) para o PIB argentino. Com as reformas econômicas em andamento sob a gestão de Milei, que incluem a eliminação de barreiras aduaneiras e a simplificação do processo de importações, há uma expectativa positiva em relação à normalização do comércio bilateral. (GARCIA, 2024)

No entanto, o novo esquema cambial argentino, que fraciona a liberação de dólares para pagamentos internacionais, tem gerado incertezas entre os exportadores brasileiros, afetando diretamente as transações comerciais e influenciando tanto o volume quanto a fluidez das exportações do Brasil para a Argentina. Embora haja otimismo em relação ao fim das restrições administrativas anteriores, persistem preocupações sobre as incertezas cambiais que podem impactar o comércio bilateral de forma negativa. Apesar dos desafios econômicos e ajustes em curso, a relação comercial entre Brasil e Argentina permanece sólida no ano de 2024. 

Conclusão

Diante dos acontecimentos políticos e econômicos em curso, a relação entre Brasil e Argentina entra em um período de análise e adaptação. A ascensão do presidente argentino Javier Milei marca uma nova fase nas interações entre os dois países, com potencial para remodelar dinâmicas históricas e impulsionar uma cooperação renovada.

Para o futuro, é possível esperar uma continuidade na evolução das relações entre Brasil e Argentina, com base nos acontecimentos recentes e nos desafios em curso. No campo político, é importante observar como os líderes dos dois países irão lidar com as diferenças ideológicas e políticas enquanto buscam áreas de cooperação e entendimento mútuo. O diálogo entre os governos e a manutenção de canais abertos de comunicação são essenciais para garantir um relacionamento construtivo e produtivo. E aspecto econômico, a estabilização da economia argentina e a implementação de políticas voltadas para o crescimento e a abertura comercial podem criar oportunidades para uma maior integração econômica entre os dois países. Também, a conclusão do acordo entre o Mercosul e a União Europeia e a normalização do comércio bilateral podem impulsionar o crescimento econômico e o desenvolvimento regional sul-americano.

Referências Bibliográficas:

BALTENSPERGER, Michael; DADUSH, Uri. The European Union-Mercosur Free Trade Agreement: prospects and risks. Policy Contribution, n. 11, 2019.

BMC NEWS. Brasil e Argentina Buscam Superar Desafios para Fortalecer Comércio no Mercosul. Disponível em: https://bmcnews.com.br/2024/04/06/brasil-e-argentina-buscam-superar-desafios-para-fortalecer-comercio-no-mercosul/. Acesso em: 09 abr. 2024.

CNN BRASIL. Inflação na Argentina recua e atinge -1,1% em março; em 12 meses, preços subiram 28,8%. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/inflacao-na-argentina-recua-e-atinge-11-em-marco-em-12-meses-precos-subiram-288/.  Acesso em: 09 abr. 2024.

CANDEIAS, WARLEY. Relações Brasil-Argentina: uma análise dos avanços e recuos. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbpi/a/Xx4w4rxPPBfX3FmWZHDtYfK/?lang=pt&format=pdf. Acesso em: 09 abr. 2024.

COBIZZ. Relações Brasil e Argentina ao Longo do Tempo. Disponível em: https://cobizz.com.br/2021/10/07/relacoes-brasil-e-argentina-ao-longo-do-tempo/. Acesso em: 09 abr. 2024.

ESTADÃO. Javier Milei e Luiz Inácio Lula da Silva: presidência da Argentina, eleições e Sergio Massa. Disponível em: https://www.estadao.com.br/internacional/javier-milei-luiz-inacio-lula-da-silva-presidencia-argentina-eleicoes-sergio-massa-nprp/. Acesso em: 09 abr. 2024.

GARCIA, Gabriel. Exportações para Argentina recuam 28% no 1º bimestre. CNN Brasil, 03 mar. 2023. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/exportacoes-para-argentina-recuam-28-no-1o-bimestre/. Acesso em: 19 jun. 2024.

G1. Futura chanceler de Milei se encontra com ministro Mauro Vieira em Brasília. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/11/26/futura-chanceler-de-milei-se-encontra-com-ministro-mauro-vieira-em-brasilia.ghtml. Acesso em: 09 abr. 2024.

Nathalia Braga dos Santos

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