O BEM VIVER COMO ALTERNATIVA AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO G20

O BEM VIVER COMO ALTERNATIVA AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO G20
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a sessão de abertura da Reunião Ministerial da Força Tarefa para o Estabelecimento de uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, na sede da ONG Ação da Cidade, Rio de Janeiro (RJ), 2024 (Foto: Ricardo Stuckert/Fotos Públicas)

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento sustentável é um dos temas que englobam a agenda do G20 em termos econômicos, sociais e ambientais desde que o aquecimento global começou a ser uma preocupação para os Estados e para a sociedade. No entanto, é possível pensar em alternativas ao desenvolvimento sustentável considerando que o que nos levou a toda essa questão foi o formato socioeconômico advindo do capitalismo? O Bem Viver, teoria criada por Acosta (2016), pode nos direcionar para uma alternativa pensada em 2008 e incorporada na Constituição do Equador.

ALTERNATIVA PARA UM NOVO MUNDO: O BEM VIVER

O G20 é um fórum de cooperação econômica internacional exercendo um papel importante no reforço e na definição e governança globais sobre economia internacional (G20, 2024). A organização diferente de outras organizações internacionais: não tem pessoal permanente, a mudança da presidência ocorre anualmente e é rotativa, assim, todos os anos o presidente incumbido deve escolher quem será o secretário provisório durante sua gestão (BCB, 2024). 

Durante todo o ano, o trabalho da presidência é realizado, todavia, o ponto alto desse esforço é quando a Cúpula ocorre, contando ela com a participação de todos os chefes de Estado ou de Governo dos países membros. O G20, desde sua criação, tem uma agenda que concentra temas de macroeconomia no geral. No entanto, ao passo que ocorriam mudanças a nível global, o fórum expandiu sua agenda para incluir temas como: comércio, desenvolvimento sustentável, saúde, agricultura, energia, meio ambiente, mudanças climáticas e combate à corrupção (G20, 2024).

Dentre os temas da agenda do fórum, nesse artigo, daremos enfoque ao desenvolvimento sustentável. Para Acosta (2016), o desenvolvimento teve sua “criação” em 20 de janeiro de 1949, com a posse de Truman na cadeira de presidente dos Estados Unidos. Em seu discurso ao Congresso, definiu a maior parte do mundo como “áreas subdesenvolvidas”, e nesse momento ficou claro que os outros teriam que percorrer ou “subir a escada” que os países desenvolvidos “subiram” para alcançar o tão sonhado progresso, assim como ficou claro uma nova forma de imperialismo: o desenvolvimento (Acosta, 2016). Ao tornar-se a meta global, a humanidade passou por uma difusão dos valores norte-americanos herdados pelo velho mundo. Assim, “o ‘desenvolvimento’, como toda crença, nunca foi questionado, foi simplesmente redefinido por suas características mais destacadas.” (Acosta, 2016, p. 45).

A América Latina, entretanto, sempre foi contestadora do desenvolvimento tradicional, como, por exemplo, o estruturalismo ou as diferentes camadas da teoria da dependência. O estruturalismo é uma perspectiva teórica da segunda metade do século XX, a qual analisa a ordem global por uma lente de sistema inter-relacional. A abordagem se distancia do foco tradicional das relações internacionais as quais tem o Estado como ator único, nesse sentido, prioriza a compreensão das estruturas subjacentes que moldam o comportamento dos Estados e o cenário internacional. Tem como principais teóricos: Raymond Aron, Kenneth Waltz e Robert Cox (Jackson e Sorensen, 2007). A teoria da dependência, por sua vez, é apresentada referindo-se à busca da compreensão sobre as desigualdades estruturais entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos no sistema internacional. Tem como principal teórico Immanuel Wallerstein (Farny, 2016). Essas críticas foram enfáticas, no entanto, as propostas não prosperaram.

No entanto, como já dissemos, estas posturas heterodoxas não conseguiram questionar seriamente os núcleos conceituais da ideia de desenvolvimento convencional, entendido como progresso linear e expresso em termos de crescimento econômico. Cada um desses questionamentos suscitou uma onda de revisões que não puderam somar-se ou articular-se entre si. Em alguns casos, provocaram um ponto alto nas críticas e inclusive nas propostas, mas não conseguiram transformar-se em ferramenta superadora do status quo. (ACOSTA, 2016, p. 59).

Com essa mesma linha de pensamento, foi incorporado a temática o “desenvolvimento sustentável”, que segundo Acosta (2016), é uma necessidade das gerações presentes em satisfazer suas necessidades sem pactuar as gerações futuras para que as mesmas tenham a possibilidade de atender às próprias necessidades. 

Hand Shape on Sand like Aboriginal Art Style (Foto: Imagem Gratuita do Canva)

Nesse contexto, o Bem Viver aparece como uma alternativa ao desenvolvimento e, em outras palavras, ao capitalismo. O conceito de Bem Viver, ou Sumak Kawsay na linguagem Kichwa, foi apresentado por Alberto Acosta (2016) como uma alternativa ao modelo de desenvolvimento hegemônico, baseado no crescimento econômico ilimitado e na exploração desenfreada da natureza. O livro e o conceito, vem de uma inspiração nas cosmovisões andinas, o Bem Viver propõe uma visão global da vida que prioriza o bem-estar das pessoas em harmonia com a natureza.

O Bem Viver tem como princípios fundamentais: harmonia com a natureza, bem-estar individual e coletivo, igualdade e justiça social, economia solidária e democracia participativa. O Bem Viver é um conceito teórico, mas também um conjunto de práticas e iniciativas que estão sendo implementadas em alguns países latino-americanos. O Equador foi o primeiro país a incorporar o conceito em sua constituição em 2008, reconhecendo os direitos da Natureza e garantindo a participação indígena na tomada de decisão.

Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante Encontro com lideranças e coordenadores de organizações indígenas. Palácio do Planalto, Rio de Janeiro (RJ), 2024 (Foto: Ricardo Stuckert/Fotos Públicas)

CONCLUSÃO

Um dos propósitos de teorias como a de Acosta (2016) é questionarmos o status quo e a quem o mesmo favorece. Nesse sentido, “será possível escaparmos do fantasma do desenvolvimento?” (Acosta, 2016, p. 64). A tarefa mais difícil no processo de construção de novas realidades é a possibilidade de imaginarmos um pós-capitalismo — “e não apenas o pós-neoliberalismo” (Acosta, 2016, p. 65) — como horizonte. Assim, Acosta (2016, p. 66) aponta:  

Quando falamos do Bem viver, propomos, primeiramente, uma reconstrução utópica do futuro a partir da visão andina e amazônica. No entanto, esta aproximação não pode ser excludente ou produzir visões dogmáticas. Deve complementar-se e ampliar-se, necessariamente, incorporando outros dispositivos e outras propostas provenientes de diversas regiões do planeta espiritualmente aparentadas em sua luta por uma transformação civilizatória.

Enquanto países latino-americanos, devemos pensar e propor uma transição a outras formas de organização da produção e da sociedade. Em nenhum momento, pensar no Bem Viver trata-se de “atrasar” ou evitar que os países “subdesenvolvidos” de crescer, mas sim de abordar maneiras de tratar o tema do crescimento com responsabilidade. Com isso em mente, o Brasil, na qualidade de atual presidente do G20 e anfitrião da Cúpula do G20, tem uma oportunidade única de apresentar ao mundo uma alternativa de crescimento que vá além da ideia tradicional de desenvolvimento sustentável.

IMAGENS

STUCKERT, Ricardo. Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a sessão de abertura da Reunião Ministerial da Força Tarefa para o Estabelecimento de uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, na sede da ONG Ação da Cidade. Fotos Públicas, 2024. [Fotografia]. Disponível em: https://www.fotospublicas.com/acervo/saude/presidente-lula-abre-a-sessao-da-reuniao-ministerial-da-forca-tarefa-para-o-estabelecimento-de-uma-alianca-global-contra-a-fome-e-a-pobreza. Acesso em: 28 Jul. 2024.

STUCKERT, Ricardo. Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante Encontro com lideranças e coordenadores de organizações indígenas. Fotos Públicas, 2024. Disponível em: https://www.fotospublicas.com/acervo/cotidiano/presidente-da-republica-lula-da-silva-encontra-com-liderancas-e-coordenadores-de-organizacoes-indigenas. Acesso em: 28 Jul. 2024.

IZZOTTI, Andrea. Hand Shape on Sand like Aboriginal Art Style. Canva. Disponível em: https://www.canva.com/photos/MADCMejDpQ4/. Acesso em: 28 Jul. 2024.

REFERÊNCIAS

ACOSTA, Alberto. O Bem Viver: uma oportunidade para imaginar outros mundos.  Tadeu Breda (Trad.). São Paulo: Autonomia Literária, Elefante, 2016.

BCB. Grupo dos Vinte (G-20). BCB, s.d. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/rex/g20/port/mencaog20.asp?frame=1. Acesso em: 21 jul. 2024.

FARNY, Elisabeth. Dependency Theory: A Useful Tool for Analyzing Global Inequalities Today?. E-International Relations, 2016. Disponível em: https://www.e-ir.info/2016/11/23/dependency-theory-a-useful-tool-for-analyzing-global-inequalities-today/. Acesso em: 21 jul. 2024.

JACKSON, Robert H; SORENSEN, George. Introdução às relações internacionais: teoria e abordagens. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007. 

G20. Sobre o G20. G20, 2024. Disponível em: https://www.g20.org/pt-br/sobre-o-g20. Acesso: 21 de Julho de 2024.

Victória Catarina Nascimento

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