CRISES E GOVERNANÇA: A HISTÓRIA DO G20

CRISES E GOVERNANÇA: A HISTÓRIA DO G20

Montagem feita com líderes globais. Da direita para a esquerda: presidente francês Macron e presidente brasileiro Lula, presidente da Comissão da União Africana Mahamat, presidente da União Africana Ghazouani, primeiro-ministro indiano Modi, presidente chinês Xi Jinping e presidente norte-americano Biden.

INTRODUÇÃO

A comunidade internacional tem como um de seus maiores desafios, desde o início do século XX, a criação de organismos e instituições que possam oferecer um espaço para diálogo, coordenação de ações conjuntas e adoção de regras no combate a crises. Os Estados buscam superar essa dificuldade em nome da cooperação e da convivência pacífica no sistema internacional (Pontes; Lyrio, 2024). Assim, para lidar com essa necessidade, um dos mecanismos criados a nível de Estados foi o Grupo dos 20, ou G20.

Com uma longa história de tentativa e erro, além de expansões movidas por crises e pelo reconhecimento de mazelas internacionais, o G20 surgiu como um aparato para incentivar o fortalecimento da governança global (Cooper, 2010). Hoje, o G20 é composto pelas “vinte” maiores economias mundiais — na verdade, 21, e nem todas realmente são as maiores, sendo elas: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia. Além delas, há também a União Europeia e, desde 2023, a União Africana.

É importante frisar que o G20 não é formado pelas 20 maiores economias no mundo, como se a posição no ranking fosse determinante para a inclusão no grupo. A África do Sul, por exemplo, estava na posição 25, em 2011, enquanto a Espanha, que não está incluída como membro, estava na posição 13. Assim, os critérios para se tornar parte efetiva do grupo incluem elementos não formais, estabelecidos durante a reunião dos Ministros das Finanças do G20, em 1999, que decidiu que a filiação se basearia na capacidade de determinado país de contribuir para a estabilidade econômica e financeira global. (Xavier, 2024, n.p.).

Com países americanos, europeus, asiáticos, africanos e oceânico, o G20 caracteriza-se por sua diversidade regional. No mapa abaixo, é possível observar a amplitude da organização. Os países em salmão são os Estados-membros do G20. Os países em roxo são os Estados representados pela União Europeia. Aqueles em verde são os Estados representados pela União Africana. Por fim, o país em amarelo é a Espanha, país permanentemente convidado às reuniões do G20, que, apesar de ser uma das 20 maiores economias mundiais, não faz parte oficialmente do Grupo dos 20 (Pontes; Lyrio, 2024).

Mapa com os países do G20 em 2023. Os países em salmão são os Estados-membros do G20. Os países em roxo são os Estados representados pela União Europeia. Aqueles em verde são os Estados representados pela União Africana. Por fim, o país em amarelo é a Espanha, país permanentemente convidado às reuniões do G20, que, apesar de ser uma das 20 maiores economias mundiais, não faz parte oficialmente do Grupo dos 20.
Países do G20 em 2023 (Wikicommons, 2023a).

Este é o primeiro artigo do Especial G20 do Dois Níveis. Nos próximos dias, publicaremos artigos de temas variados explorando os mais diversos âmbitos deste fórum. Neste texto, iremos desbravar a história do G20 e analisar sua importância para a governança global e o combate às crises internacionais.

O PRIMEIRO PASSO: CRISE ASIÁTICA DOS ANOS 1990

Quais são as raízes do G20? O grupo tem como marcos as várias crises do sistema internacional, sendo chamado de “quebrador de crises” (Cooper, 2010). As últimas décadas do século XX foram marcadas pela instabilidade econômica em vários mercados emergentes, incluindo o Brasil (Hobsbawm, 2020; Pontes; Lyrio, 2024), mas o evento que desencadeou a criação do G20 ocorreu no fim dos anos 1990: a crise financeira na Ásia. Essa crise começou na Tailândia em 1997 e se expandiu para a ASEAN-4 (Associação de Nações do Sudeste Asiático, que incluía Indonésia, Malásia, Filipinas e Tailândia), para o Norte Asiático (atingindo a Coreia do Sul, Taiwan, Hong Kong e o Japão) e, por fim, para outros países emergentes, do Brasil à Rússia (Goldstein, 1998).

As causas dessa crise vão desde a saída de capitais desses países aos ataques especulativos contra suas moedas (Pontes; Lyrio, 2024). A crise destacou os problemas da falta de regulamentação do sistema financeiro internacional recém-globalizado, bem como as limitações das instituições do sistema de Bretton Woods — Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional (FMI) — e de grupos restritos, como o Grupo dos 7 (G7), para combater crises transnacionais (Pang, 2000; Pontes; Lyrio, 2024).

Além desse cenário, a emergência de várias potências que mudavam o equilíbrio global em âmbito econômico (e político), como a China, a Índia e o Brasil, serviu para aumentar as críticas ao sistema financeiro da época. Este sistema estava concentrado nas grandes potências do G7, que iam perdendo cada vez mais espaço nas relações econômicas para as nações emergentes (Pang, 2000; Pontes; Lyrio, 2024). Além disso, após a crise asiática iniciada na Tailândia e em virtude da economia mundial recém-globalizada e do poder desses novos atores econômicos, percebeu-se a “possibilidade de que crises deflagradas em países em desenvolvimento também pudessem ‘contaminar’ as economias consideradas ‘centrais’” (Pontes; Lyrio, 2024, p. 17).

Um outro motivo foi o surgimento, na época, de questionamentos sobre a maneira em que a economia internacional era regida. As décadas de 1980 e 1990 foram marcadas por uma desregulamentação do sistema financeiro internacional, o que incluía a diminuição da intervenção estatal na economia e a obediência a regras delimitadas pelo FMI (Harvey, 1989). Esse fenômeno foi liderado pelas instituições de Bretton Woods, e as novas regras internacionais foram estabelecidas pelo Consenso de Washington.

Nesse contexto, o Institute for International Economics promoveu uma conferência (o programa neoliberal do Consenso de Washington) que definiu pontos a serem trabalhados pelos países em sua política econômica para restabelecer as leis de mercado e buscar estabilidade monetária, como a derrubada de restrições a investimentos estrangeiros, privatizações, reforma tributária, entre outros (Moniz, 2002). Um dos focos desta reunião era convencer tais governos de que a intervenção estatal na economia não era mais tão necessária quanto antes.

Esse movimento teve graves consequências globais. Até hoje não há consenso sobre o papel do FMI, com essas estratégias, na melhora ou no agravamento da crise asiática (Ponte; Lyrio, 2024). A América Latina, todavia, esteve particularmente vulnerável a essas políticas. Houve o agravamento das crises regionais, considerando o cenário latino-americano pré-existente de crise, inflação e dívida externa (Moniz, 2002; Hobsbawm, 2020). Conforme Moniz (2002), o consenso serviu como estratégia para que os EUA pudessem se aproveitar das economias fragilizadas dos países latinos, pois conseguiriam exportar mercadorias para os países da região sem fazer grandes concessões aos seus governos. Como consequência, a crise, que já existia antes da conferência, se agravou e as estratégias de livre mercado não funcionaram nem trouxeram resultados concretos para a população.

Outrossim, a questão da dívida externa, que deveria ter sido solucionada com a conferência, continuou representando um grande problema, especialmente em virtude do déficit nas balanças comerciais das nações latino-americanas. Não apenas isso, mas os impactos sociais foram altos. Robert Gilpin (2002) afirma que alguns aspectos e consequências da economia de mercado, típica de abordagens neoliberais, são efeitos maléficos sobre a sociedade e desigualdades na distribuição de riqueza e poder. Com base nisso, Moniz (2002) e Gilpin (2002) concordam quando apontam as implicações sociais desse modelo econômico na região da América Latina.

Percebe-se, então, que o fim do século XX foi marcado por crises econômicas a nível global, a maioria delas fora do contexto de países centrais. Não apenas isso, mas os países mais afetados pelas crises — países asiáticos e latino-americanos — não tinham voz significativa nos fóruns internacionais de economia (Pontes; Lyrio, 2024). Buscou-se, a partir disso, algumas tentativas de democratização do sistema econômico global antes da criação do G20. O G22 surgiu em 1997 com o agravamento da crise financeira na Ásia e na América Latina como um grupo mais amplo de países (integrado pelo G7 e outros quinze Estados) que se reuniram para tratar de temas relacionados à crise financeira internacional que afetava sobretudo países em desenvolvimento, reunindo-se no nível de ministros da Economia ou Finanças e presidentes de Bancos Centrais. Em 1999, o G22 foi ampliado e chegou a tornar-se G33, mas este foi extinto no mesmo ano para dar lugar ao G20.

Por fim, neste mesmo ano, o G20 surgiu como um fórum informal de diálogo entre ministros de Economia e Finanças e presidentes de Bancos Centrais, no qual eram discutidos temas econômicos para resolução coordenada de crises globais na área (Pontes; Lyrio, 2024). Conhecido como G20 financeiro, tinha por objetivo criar um foro mais inclusivo para os debates globais sobre estabilidade econômico-financeira, reunindo os países do Grupo dos 7 e nações em desenvolvimento com importância econômica internacional (Pontes; Lyrio, 2024).

Sua criação foi motivada porque o G7, por si só, não conseguia mais prevenir os problemas internacionais, a crise asiática deixou isso bem claro. Então, ao criar o G20, as potências centrais precisaram identificar as grandes economias de cada região do planeta. Essa identificação tinha por objetivo escolher as principais economias globais, incluindo as de países em desenvolvimento, considerando também a importância da diversidade geográfica. Assim, nenhuma economia de grande porte ficou fora desse grupo (Pontes; Lyrio, 2024). Em 1999, esta era a composição do G20: União Europeia, África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia. Esses países, na época, representavam ⅔ da população mundial e mais de ¾ do comércio global (Pontes; Lyrio, 2024).

Mapa mundi com os componentes do G20 com participação em outro grupos (G7 em laranja, G8 em amarelo, G5 em rosa e G20 em rosa pink).
Componentes do G20 com participação em outros grupos (G7; G8; G5) (Wikicommons, 2023b).

Destaca-se aqui as peculiaridades do processo de criação do G20. Ele foi criado no seio do G7, ou seja, é fruto das preocupações dos países centrais que reconheceram “a necessidade de um espaço mais inclusivo para tratar dos desafios da economia global” (Pontes; Lyrio, 2024, p. 19). Além disso, não conta com uma estrutura formal, nem um tratado fundador, além de não ter um secretariado (Hajnal, 2019). Seus encontros anuais têm como objetivo estabelecer um ambiente para diálogo e interação entre líderes, além de promover a adoção de declarações baseadas em visões compartilhadas sobre questões de relevância global. A primeira cúpula do G20 ocorreu em dezembro de 1999, em Berlim.

O grupo atuou, desde seu início, lado a lado com as organizações de Bretton Woods, incentivando sua reforma e financiando-as (Cooper, 2010; Pontes; Lyrio, 2024). Todavia, vale destacar que de 1999 até 2008, o fórum não teve um papel de maior destaque. Ele, nessa data, era composto apenas pelos ministros de Finanças e Economia e pelos presidentes dos Bancos Centrais, além de não ter poder vinculante (e isso até hoje), ou seja, de fazer com que suas decisões sejam obrigatoriamente obedecidas pelos Estados-membros. Ademais, ainda era um mecanismo limitado, que não solucionava as demandas internacionais por mais representação de Estados periféricos. Esse cenário teve várias mudanças a partir da crise de 2008.

A EXPANSÃO DO G20: A CRISE DE 2008

Em 2008, uma crise financeira de proporções internacionais atingiu o mundo. A “Grande Recessão” de 2008-9, também chamada de crise do subprime (Lima; Deus, 2013), foi causada pelo estouro da bolha imobiliária nos EUA, que resultou em uma crise de liquidez (Cooper, 2010; Pontes; Lyrio, 2024). Antes da crise, os EUA passavam por um momento bom em sua economia — a inflação estava baixa e os juros também — e o mundo estava em uma boa fase de liquidez internacional. Todavia, a partir das medidas liberalizantes da década de 1990, que incluíam, para além da desregulamentação do setor bancário, o livre fluxo de capital (dinheiro) entre países e o aumento de inovações financeiras (novas formas de serviços financeiros ou de produção de serviços financeiros que já existiam), houve um aumento na concorrência entre instituições financeiras internacionais (Lima; Deus, 2013).

Essa competitividade, somada aos baixos juros, fizeram com que as transações tradicionais nos EUA tivessem baixa lucratividade (Carvalho, 2008). Como consequência, os americanos buscaram mercados mais rentáveis (Lima; Deus, 2013). Como opção inicial, havia os empréstimos a países emergentes, entretanto, essa opção não foi considerada em virtude das crises nestes desencadeadas desde a década de 1990 por causa destes mesmos empréstimos (Carvalho, 2008). A segunda opção viável foi o mercado imobiliário americano. Com o contexto favorável, o acesso a imóveis nos EUA estava acessível a muitas famílias, e as instituições financeiras, para ampliar este mercado, decidiram conceder crédito a uma parcela da população classificada como subprime (“de alto risco”, em português), um grande e perigoso mercado potencial, sem “garantias, comprovante de renda ou mesmo histórico de crédito favorável ao tomarem esses empréstimos” (Lima; Deus, 2013, p. 54). Na verdade, a única garantia do empréstimo era o próprio imóvel, agora hipotecado. Não apenas isso, mas as instituições securitizaram essas hipotecas, isto é, transformaram as dívidas em títulos no mercado financeiro para serem vendidos e comprados por investidores, que receberiam o valor pago pelos pagadores de juros (Carvalho, 2008).

Sabendo disso, como a crise surgiu? Os juros iniciais desses empréstimos eram muito baixos, mas subiam drasticamente depois de algum tempo (Carvalho, 2008). Entretanto, com o aumento dos juros, os tomadores não conseguiram mais pagar as suas prestações, surgindo, então, o risco de crédito (Lima; Deus, 2013). A partir disso, ocorreu uma reação em cadeia. Os investidores perceberam os riscos de perderem a rentabilidade dos títulos e tentaram vendê-los (Carvalho, 2008). Entretanto, não encontraram quem os comprasse, o que causou um cenário de risco de liquidez, isto é, de impossibilidade de revenda sem altos prejuízos (Carvalho, 2008, p. 4). Em virtude disso, houve uma queda nos preços dos títulos. Só que os títulos afetados não foram apenas os do subprime, mas muitos outros na economia americana, uma vez que os agentes econômicos agora estavam com receio de sofrer outro calote e buscaram vender seus outros investimentos, o que foi derrubando cada vez mais os preços de todos os títulos (Carvalho, 2008; Lima; Deus, 2013). Então, iniciou-se a fase de crise patrimonial — nela, o valor das obrigações e dívidas da empresa, ou seja, dos passivos, se tornou maior do que o de seus ativos (bens, valores), o que as deixou em estado de insolvência, falência (Carvalho, 2008). Nesse momento, vários bancos quebraram, o desemprego aumentou e a crise econômica nos EUA chegou ao seu auge.

Quando a situação chega ao ponto de crise patrimonial, conforme Carvalho (2008), há duas alternativas. De um lado, bancos e financeiros falidos devem ser fechados, sofrer intervenção ou ser vendidos a outras instituições, o que, num cenário de estresse, causa desconfiança e medo no mercado financeiro e na sociedade geral. Do outro, há a retração das instituições sobreviventes, porque compartilham da desconfiança e do medo supracitados e porque seu capital e, consequentemente, sua capacidade de empréstimo diminuem. Nesse segundo caso, que abarcou os EUA e o sistema internacional, causando uma diminuição na liquidez global, bancos e instituições financeiras emprestam menos, a economia esfria, o crescimento econômico congela ou diminui.

Diante disso, se as economias globais não se relacionassem entre si, esse problema estaria recluso aos Estados Unidos. Entretanto, em um sistema financeiro globalizado, com livre fluxo de capitais e menores regulamentações, este não era o cenário de 2008 (Carvalho, 2008; Pontes; Lyrio, 2024). A crise americana se estendeu a vários países, incluindo o Brasil, mas causou estragos maiores na Europa (Pontes; Lyrio, 2024). Como resultado, houve uma desaceleração mundial e uma desconfiança sobre o estado da saúde da economia global.

Seria necessária uma abordagem coordenada para solucionar esta crise e uma reforma do sistema financeiro internacional, que era merecedor de críticas desde antes da Grande Recessão (Cooper, 2010). Para tanto, o escopo de atuação do G20 deveria transcender o nível ministerial, e assim o fez — a partir de 2008, o Grupo dos 20 passou a se reunir a nível mais elevado, contando com a participação de chefes de Estado e de Governo (Pontes; Lyrio, 2024). Isso ocorreu por iniciativa do presidente George W. Bush, a partir de pressões de países em desenvolvimento, inclusive do Brasil, que presidia o grupo durante aquele ano (Pontes; Lyrio, 2024). O primeiro encontro a nível de chefes de Estado e de Governo do G20, a Cúpula sobre Mercados Financeiros e Economia Mundial, ocorreu em Washington, em 15 de novembro de 2008, visando buscar medidas para lidar com a crise financeira global (Hajnal, 2019). Conforme Pontes e Lyrio (2024), as medidas acordadas na cúpula foram:

  • Uso de políticas fiscais para estimular a demanda interna;
  • Ampliação do acesso de países em desenvolvimento a financiamentos;
  • Fortalecimento da transparência e promoção de maior regulação dos mercados financeiros;
  • Reforma das “instituições financeiras internacionais” para que refletissem de forma mais adequada a nova realidade econômica mundial, atribuindo voz aos países em desenvolvimento.

Em 2009, na segunda cúpula do G20 em Pittsburgh, o grupo consolidou-se de fato como meio de diálogo entre as maiores economias mundiais. A Declaração de Pittsburgh reconhecia a necessidade de reforma do sistema financeiro internacional e da inclusão de nações em desenvolvimento nos debates sobre economia global (Cooper, 2010; Pontes; Lyrio, 2024). Desde então, cúpulas anuais têm ocorrido em âmbito do G20, buscando lidar com questões de interesse global na esfera econômica.

Foto de chefes de Estado e/ou de Governo na Cúpula do G20 na Itália, em 2021.
Cúpula do G20 na Itália, em 2021 (Palácio do Planalto, 2021).

Não apenas isso, mas com a expansão do G20 ao nível de chefes de Governo e de Estado, o G20 se tornou um fórum de discussão de muitas outras temáticas, trabalhadas em Grupos de Trabalho específicos. Existe, hoje, no fórum, a trilha financeira, que objetiva estabelecer normas e alcançar a regulação do mercado financeiro, e a trilha de sherpas, com agenda estratégica mais abrangente e contornos políticos, visando estabelecer processos e obter resultados (Pontes; Lyrio, 2024; Xavier, 2024). Há também os grupos de engajamento, que reúnem representantes da sociedade civil para aproximar o G20 da sociedade e enriquecer o debate.

O G20 NA GOVERNANÇA GLOBAL

Conforme Pontes e Lyrio (2024), governança global é:

[…] uma ideia‑força assentada no princípio de que os Estados dialogam e cooperam entre si porque muitos dos problemas que enfrentam extrapolam as fronteiras nacionais e só podem ser efetivamente solucionados por meio de ações negociadas e decididas em formato coletivo, de alcance geográfico circunscrito (“regional”) ou global (“multilateral”), de caráter universal e aberto (“plurilateral”) ou fechado aos demais países. (Pontes; Lyrio, 2024, p. 10).

A partir disso, os autores concluem que, no sistema internacional, as ações de governança ainda são imperfeitas e fragmentadas, além de demandarem cooperação transnacional. Para minorar esse problema, foram criadas diversas instituições e organizações regionais e internacionais em busca de mecanismos eficientes para solucionar mazelas que ultrapassam fronteiras, como as Nações Unidas, a Organização Mundial do Comércio, entre outras (Pontes; Lyrio, 2024). Todavia, elas se mostraram em muitos casos falhas ou insuficientes. Isso acarretou na busca por uma “desglobalização” econômica (e geral), um retorno a ideais nacionalistas e centralizados no planejamento estatal, o que ameaça até mesmo a estabilidade da democracia (Bittar, 2012).

A era da ‘desglobalização’ […] traduz a ideia de uma era marcada pela desaceleração econômica, pela apatia dos mercados, que trazem como decorrência efeitos concretos muito claramente identificáveis, do ponto de vista macroeconômico, como também do ponto de vista político. São exemplos o retorno ao nacionalismo, as tendências de protecionismo econômico, […] acompanhadas pelo conservadorismo das urnas e pela multiplicação de cânticos de incitação ao fanatismo e do retorno às origens das doutrinas religiosas […]. (Bittar, 2012, p. 266-267).

Nesse cenário, entretanto, o G20 ainda consegue prevalecer. O grupo é diferentes das organizações do pós-Segunda Guerra Mundial, pois sua natureza não vinculante é mais informal e flexível, além de o grupo conseguir comportar as maiores economias globais com uma diversidade regional destacável e uma diversidade econômica-social tangível — uma metade aproximada dos países do G20 são desenvolvidos e a outra em desenvolvimento ou emergentes (Xavier, 2024; Pontes; Lyrio, 2024). Assim, o G20 consegue agir como um meio aberto de diálogo entre os países, o que permite a coordenação de medidas e avanços concretos que não tiveram o mesmo alcance por outros foros (Pontes; Lyrio, 2024). Além disso, com as trilhas de finanças e de sherpas, são variados os temas de debate e as questões trabalhadas, abrangendo questões de gênero, trabalho, empresas, entre outras (Xavier, 2024).

CONCLUSÃO

Neste artigo, entendemos a história do G20 e como sua criação, evolução e expansão foi ditada pela situação do sistema internacional e suas crises. Assim, compreendemos a criação do grupo em 1999, como fruto de decisões do G7 e de pressões de nações em desenvolvimento em nome da representação no sistema financeiro internacional. Também analisamos a expansão e evolução do G20 a nível de chefes de Estado e de Governo a partir da crise global de 2008, compreendendo os impactos desta evolução dos diálogos e medidas coordenadas em âmbito de governança global e cooperação a partir de então.

Por fim, entendemos o impacto do G20 na governança global. O grupo propõe uma forma inovadora neste contexto, reunindo países com influência econômica, sem mandato preestabelecido, com espaços mais abertos e informais de negociação. Além disso, as decisões provenientes das discussões influenciam os Estados-membros, os demais países e as organizações internacionais a adotarem políticas e medidas em âmbito nacional de maneira coordenada. Logo, o G20 consegue delimitar as prioridades de discussões em âmbito global e formular diretrizes sobre os mais variados temas.

IMAGENS

PALÁCIO DO PLANALTO. Family photo G20 Italy 2021. Wikicommons, 2021. [Fotografia]. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Family_photo_G20_Italy_2021.jpg. Acesso em: 23 jun. 2024.

WIKICOMMONS. G20 2023 map. Wikicommons, 2023a. [Figura]. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:G20_2023_map.svg. Acesso em: 23 jun. 2024.

WIKICOMMONS. G5 G7+1 G20. Wikicommons, 2023b. [Figura]. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:G5_G7%2B1_G20.svg. Acesso em: 23 jun. 2024.

IMAGENS DE CAPA

CONEXIÓNCOP. 9-COP21 Xi Jinping, Presidente de China. Wikicommons, 2015. [Fotografia]. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:9-COP21_Xi_Jinping,_Presidente_de_China_(23081212139).jpg. Acesso em: 23 jun. 2024. [Alterações feitas como colagem na imagem de destaque no artigo.]

DFID. His Excellency Mohammed Ould Cheikh El Ghazouani, President of Mauritania, at the UK-Africa Investment Summit, 20 January 2020. DFID – UK Department for International Development, 2020. [Fotografia]. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:His_Excellency_Mohammed_Ould_Cheikh_El_Ghazouani,President_of_Mauritania,_at_the_UK-Africa_Investment_Summit,_20_January_2020(cropped).jpg. Acesso em: 28/08/2024. [Alterações feitas como colagem na imagem de destaque no artigo.]

DFID. His Excellency Moussa Faki Mahamat, Chairperson of the African Union Commission, speaking at the UK-Africa Investment Summit, London, 20 January 2020. DFID – UK Department for International Development, 2020. [Fotografia]. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:His_Excellency_Moussa_Faki_Mahamat,_Chairperson_of_the_African_Union_Commission,_speaking_at_the_UK-Africa_Investment_Summit,_London,_20_January_2020_(49418931217).jpg. Acesso em 23 jun. 2024. [Alterações feitas como colagem na imagem de destaque no artigo.]

LIENEMANN, David. Joe Biden official portrait 2013. Wikicommons, 2013. [Fotografia]. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Joe_Biden_official_portrait_2013.jpg. Acesso em: 23 jun. 2024. [Alterações feitas como colagem na imagem de destaque no artigo.]

LULA Oficial. 14.06.2024 – Reunião bilateral com o Presidente da República Francesa, Emmanuel Macron. Wikicommons, 2024. [Fotografia]. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:14.06.2024_-_Reuni%C3%A3o_bilateral_com_o_Presidente_da_Rep%C3%BAblica_Francesa,_Emmanuel_Macron_(53791653019).jpg. Acesso em: 23 jun. 2024. [Alterações feitas como colagem na imagem de destaque no artigo.]

PRIME Minister’s Office. PM Modi Addressing G20 New Delhi Summit. Wikicommons, 2023c. [Fotografia]. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:PM_Modi_Addressing_G20_New_Delhi_Summit.jpg. Acesso em: 23 jun. 2024. [Alterações feitas como colagem na imagem de destaque no artigo.]

REFERÊNCIAS

BITTAR, Eduardo. Crise econômica, desglobalização e direitos humanos:. Revista Direitos Humanos Fundamentais, [S. l.], v. 12, n. 1, 2012. Disponível em: https://revistas.unifieo.br/rmd/article/view/672. Acesso em: 28 jun. 2024.

CARVALHO, F. C. Entendendo a recente crise financeira global. In: Dossiê da Crise. Associação Brasileira Keynesiana, 2008.

COOPER, Andrew F. The G20 as an improvised crisis committee and/or a contested ‘steering committee’ for the world. International Affairs, v. 86, n. 3, p. 741-757, maio 2010. Disponível em: https://academic.oup.com/ia/article-abstract/86/3/741/2326251?login=false. Acesso em: 27 jun. 2024.

GILPIN, Robert. “A Natureza da economia política”. In: GILPIN, Robert. A Economia Política das Relações Internacionais. Brasília: Ed. UnB, 2002, pp. 25-42.

GOLDSTEIN, Morris. The Asian Financial Crisis: Causes, Cures, and Systemic Implications. Washington, DC: Institute for International Economics, 1998.

HARVEY, D. A condição pós-moderna. São Paulo: Edições Loyola, 1989.

HAJNAL, Peter I. The G20: Evolution, Interrelationships, Documentation. Londres: Routledge, 2019.

HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o Breve Século XX. Marcos Santarrita (Trad.). São Paulo: Companhia das Letras, 2020. 2. Ed.

IPEA. O que é? Subprime. IPEA, 2008. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=2156:catid=28&Itemid=23. Acesso em: 27 jun. 2024.

LIMA, Thaís D., DEUS, Larissa N. A crise de 2008 e seus efeitos na economia brasileira. Cadernos de Economia. v. 17, n. 32, p. 52-55, 2013. Disponível em: https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rce/article/view/1651. Acesso em: 27 jun. 2024.

MONIZ, L. A. As políticas neoliberais e a crise na América do Sul. Revista Brasileira de Política Internacional, v. 45, n. 2, p. 135-146, 2002.

PANG, Eul-Soo. The Financial Crisis of 1997–98 and the End of the Asian Developmental State. Contemporary Southeast Asia, v. 22, n. 3, p. 570-593, 2000.

PONTES, Kassius D. S., LYRIO, Mauricio C. O G20. 1. Ed. Fundação Alexandre de Gusmão: 2024.

XAVIER, Gabriel. O Brasil e o G20. Dois Níveis, 2024. Disponível em: https://www.doisniveis.com/doisniveis/o-brasil-e-o-g20/. Acesso em: 27 jun. 2024.

Talita Soares

Graduada em RI pela UFG, leitora nas horas vagas, concurseira na maior parte do tempo.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *